Há alguns dias revi um documentário bastante intenso, que apresenta um grande volume de informações... e que é imperdível: é o documentário “A educação proibida”. Imperdível porque estimula nosso pensamento crítico ao questionar o modelo educacional seguido por nossa sociedade.
Proponho-me, neste texto e num próximo, a transmitir algumas informações contidas nesse documentário, colocando algumas opiniões pessoais pelo caminho.
“Agora abram o caderno”.
“Fiquem quietos!”.
“Agora repitam...”.
“Quem abrir a boca ficará sem recreio”.
Quem é que não se lembra de escutar algumas frases parecidas com essas na escola?
A escola prussiana
Prússia foi um Estado monárquico, ou seja, onde o rei era o líder do governo, que existiu entre 1525 e 1947, e que chegou a ocupar áreas onde hoje estão os países Alemanha, Bélgica, Dinamarca, Lituânia, Polônia, República Checa e Rússia. A educação pública, gratuita e obrigatória tem suas bases nesse contexto, na escola prussiana do final do século XVIII.
A escola prussiana era baseada na obediência, disciplina e no regime autoritário, para criar súditos obedientes, perpetuar o modelo elitista e a divisão de classes entre clero, nobreza e camponeses. Em outras palavras, havia alguns poucos abastados (clero e nobreza cheios da grana) que tinham suas regalias sustentadas pela população pobre. Será que isso tem alguma coisa a ver com nosso atual modelo de educação? Falo de escolas públicas e privadas, sem distinção, pois escola boa não é aquela que apenas aprova seus alunos no vestibular.
... um modelo de educação para criar súditos obedientes... pensemos nisso e avancemos um pouco na história:
Com o advento da Revolução Industrial (final do sec. XVIII e início do sec. XIX), que se iniciou no Reino Unido, houve, entre outras coisas, uma transição da produção artesanal de materiais para a produção por máquinas, o desenvolvimento de novos produtos químicos e a substituição da madeira pelo carvão como combustível. Nessa época, os empresários emergentes financiaram o modelo prussiano de educação, como uma ferramenta para formar mão de obra para suas indústrias e para manter a cultura e o status quo, ou seja, manter as coisas como estavam. A partir daquele momento, os “súditos obedientes” passaram a ser os trabalhadores.
Mas será que hoje, duzentos anos depois, a escola ainda é assim, uma mera formadora de mão de obra para as empresas? Isso ainda é verdade?
A escola tradicional coloca limites ao desenvolvimento dos indivíduos através de mecanismos de controle, como as notas – “Se você se portar bem, ganhará boa nota”. Assim, pode-se afirmar que uma das bases da escola é o medo. Escolas, indústrias, quartéis e prisões seguem um modelo básico de cadeia de produção, de organização, de obediência; quem não se lembra de voltar à sala de aula depois do recreio em filas separadas de meninos e meninas, com espaçamento de um braço do colega da frente, com os de menor estatura no início e os maiores no final da fila? Alguma semelhança à disciplina militar?
“O mundo é um caos, nossa vida é um caos, mas na escola encontramos regras.” – Diretora, personagem do documentário “A educação proibida”.
A escola (quando digo escola, também incluo universidades) não é um espaço para questionamentos, a não ser os questionamentos dentro das matérias que os professores ensinam. Nossas escolas, com suas grades curriculares estruturadas, planificadas, organizadas, formuladas, burocráticas, etc. preparam “cidadãos” eficazes, Consumistas, e... Homogêneos, prontos para continuar mantendo as coisas como estão. Estamos cada vez mais Iguais. Atualmente, nos centros das grandes metrópoles ocidentais, seja São Paulo, Roma, Paris ou Nova York, veremos muitos carros, pessoas com celulares nas mãos andando apressadas, mulheres de maquiagem e cabelos lisos. Não dá pra saber em que parte do planeta você está, até que olhe para cima e veja algum monumento, como a torre Eiffel ou o MASP.
"Todos nós nascemos originais e morremos cópias" - Carl Jung, psiquiatra e psicoterapeuta suiço.
A todo momento a escola está selecionando os “melhores”, fomentando a competição e a concorrência entre os alunos.
Aliás, abro um parêntesis aqui para ajudar a desfazer um boato: aluno, do latim alumnus significa literalmente “criança de peito”; o termo aponta para a idéia de alguém imaturo, que precisa ser alimentado na boca e exige ainda cuidados paternos. Em outras palavras, é um discípulo, e não alguém “sem luz”, como afirma um boato que tomou conta da internet.
Porém, a existência de alguém que é “melhor” implica na existência de outros que não são os “melhores” e que se sentirão mal, ruins, burros, etc. Os ditos “melhores” irão para as “melhores” universidades, e formarão a elite trabalhadora, que terá seu emprego nas grandes empresas e corporações. Os que são avaliados como “piores” geralmente ficarão com os empregos com as menores remunerações... e assim vai girando a roda da vida em nossa sociedade.
Falando de roda da vida, o que desejamos para a nossa vida e a das gerações que nos sucederão?
Um desejo relativamente comum das pessoas é a paz. Todos falam da paz, mas ninguém educa para a paz. Fala-se do amor, mas ninguém educa para o amor. Como uma escola que fomenta a competição entre os alunos poderia educar para a paz e o amor?
“As crianças são nosso espelho, reflexo da sociedade em que vivem.” – educador, no documentário A Educação Proibida.
E quando se fala em hiperatividade? Ou as crianças hoje são muito mais hiperativas que há 30 anos, ou nós nãos as estamos entendendo. Será que a suposta “hiperatividade” não seria o resultado de refrigerante+biscoitos+salgadinhos+computador+videogame+celular+ausência de atividades físicas+ausência dos pais no desenvolvimento da criança? (não há tempo para perder com o filho, pois os pais precisam trabalhar para pagar sua escola e para comprar seus presentes). A criança tem uma grande necessidade de se movimentar, de gastar energia, de correr, de brincar, de experimentar, de tentar, de errar, de acertar, de suar, de se machucar... ninguém deveria ter o direito de privá-la disso, e ainda medicá-la sob o rótulo de “criança hiperativa”.
“Não sigam a mim, sigam a criança” – Maria Montessori (1870-1952), educadora italiana, criadora do Método Montessori de educação.
A questão é mais abrangente que o modelo educacional vigente, a questão é sobre o modo de vida de nossa sociedade, e onde entra a felicidade aí. O sistema capitalista, através do trabalho de cérebros brilhantes, usa a publicidade e os meios de comunicação para nos convencer de que o consumo traz felicidade. Logo após a satisfação de uma necessidade, uma nova necessidade é criada (por exemplo, você compra uma TV de última tecnologia e três meses depois é lançada uma nova TV mais fina, maior, mais leve e com mais alta definição); é assim que funciona o sistema capitalista, através da criação de desejos, nos deixando permanentemente infelizes, para que sigamos sempre consumindo.
Alguém já viu publicidade para comprarmos arroz e feijão? Mandioca? Rúcula e alface? Só nas propagandas de supermercados mesmo, falando de suas ofertas. Alguém já viu publicidade nos dizendo para tomarmos água? Dizendo-nos para dormirmos todos os dias? Para atividades naturais de nosso organismo não são necessárias propagandas, a publicidade existe para itens supérfluos. Falando sobre alimentação, é lamentável hoje, com a quantidade de informações que podemos acessar na internet, pessoas com essa possibilidade levarem seus filhos para fazer refeições em redes de fastfood, tomando refrigerante e comendo hambúrgueres. Mas isso pode ser um tema para outra reflexão. Vamos continuar.
O “ser” é mais importante que o “ter” – Buda.
Apesar de tudo, há alternativas ao modelo educativo tradicional; é possível formarmos cidadãos diversos, conscientes, tomadores de decisões, cooperativos... e felizes. Grandes nomes como Paulo Freire, Jean Piaget, Pestallozi e Rudolph Steiner perceberam essas incongruências nas escolas tradicionais e propuseram novas maneiras de se educar há centenas de anos. Agora, com a ajuda da internet, fica mais fácil o acesso às suas idéias. Com um pouco de pesquisa já se pode encontrar lugares que trabalham de forma diferente da escola tradicional, até mesmo instituições públicas, como é o caso da cidade de Nova Friburgo, no estado do Rio de Janeiro, que conta com duas escolas que funcionam seguindo a metodologia Waldorf, criada por Rudolph Steiner.
Para não me estender mais, irei falar sobre algumas características de “novas” maneiras de se educar, ainda seguindo o documentário “A educação proibida”, num próximo texto.
Bibliografia:
Documentário “A educação Proibida”, disponível no YouTube: https://www.youtube.com/watch?v=-t60Gc00Bt8 (o documentário se inicia a partir de 3 minutos e 20 segundos).
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